Apesar de tudo.
O jovem
casal preparou-se para receber as visitas.
Sabia-se que
não seriam muitas pessoas, talvez um casal ou no máximo três pessoas.
Eram
músicos, tocavam na orquestra sinfônica daquela graciosa e acolhedora cidade.
As visitas
eram estrangeiras, não se sabia ao certo de onde.
Ela, a moça,
não era lá muito simpática, podendo ser até muito deselegante e áspera.
Ao contrário
dele que era muito gentil, educado e atencioso.
Ambos
tocavam violino, e ele, além do violino tocava flauta na orquestra.
Prepararam
um pequeno repertorio para homenagear as visitas, que seria executado, logo
após o jantar.
.....
Chegaram. Vieram
em três.
Um casal e
uma simpática senhora um pouco mais velha, que era mãe de um dos dois.
A senhora
era de uma inteligência e experiência invejáveis, um humor sarcástico e ferino,
sagaz.
Após as
apresentações cordiais e educadas, foram conversar na sala de estar.
A conversa
transcorria normalmente quando a senhora, disparou a seguinte pérola:
- A sua
esposa meu jovem, apesar de tudo, é simpática.
Aquele
“apesar de tudo” causou um certo desconforto por não se saber exatamente qual o
significado daquilo.
Foram
jantar.
Os pratos
deliciosamente preparados foram servidos e apreciados por todos.
Já na altura
da sobremesa, um “petit gateaux” muito bem feito, a senhora em questão,
exclamou:
- Muito bom
o jantar, apesar de tudo!
Novamente
estava ali presente aquele incomodo e instigante “apesar de tudo”.
O rapaz não
se conteve, e, em um tom quase agressivo, uma vez que sua esposa já estava
totalmente descontrolada:
- O que a
senhora quer dizer exatamente com este “apesar de tudo”?
- O senhor
quer saber exatamente ou relativamente, apesar de tudo?
- Não
senhora! Quero saber exatamente.
Um clima
tenso tomou conta da reunião.
A senhora,
sabiamente, desconversou:
- Vocês não
iriam tocar umas peças musicais?
A pergunta
teve o efeito de uma brisa suave e refrescante em um dia quente de verão.
Imediatamente
os jovens pegaram seus instrumentos e tocaram magistralmente algumas peças
clássicas de Mozart, Schubert e um compositor pouco conhecido que não vem ao
caso.
As visitas
apreciaram muito o pequeno concerto e após um café e um licor, as despedidas de
praxe:
- Foi uma
honra recebê-los aqui em nossa casa, disse-lhes o jovem.
A esposa
claramente contrariada.
- Para nós
também. Responderam em uníssono o casal.
A senhora:
- A sua
esposa, até que toca bem, apesar de tudo!
Saíram meio
que “fugidos” debaixo de uma “chuva” de imprecações e xingamentos de toda
natureza proferidos pela não tão educada violinista.
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